A paz é fruto da justiça (Is 32,17)
Dom Pedro José Conti, bispo de Macapá
Falar em segurança pública significa mexer com algo
de bem grande e complexo. Este tipo de segurança envolve todos
nós como sociedade organizada.
Não é questão de um caso de violência
ou outro. É a própria convivência social que está
ameaçada pela agressividade entre as pessoas, pelo número
de cidadãos envolvidos, sofrendo ou fazendo sofrer por causa
de situações, meios e estruturas inadequadas, que não
cumprem a contento o seu papel na promoção e na defesa
dos direitos de todos.
Face o tamanho do desafio, temos a impressão de não
poder fazer nada, de sermos, nós mesmos, vítimas do
medo. Invocamos a sorte ou o Bom Deus para nos proteger. Muitos também
pensam que armas, grades, alarmes, telecâmaras, cercas elétricas,
cachorros brabos e mais policiamento resolveriam as situações.
As nossas casas parecem fortalezas, mas nem por isso diminui a nossa
apreensão ao ver um desconhecido bater à nossa porta.
Precisamos ter a coragem de encarar as causas mais profundas da nossa
insegurança, como também o tamanho das ameaças
que não se reduzem aos assaltos ou ao narcotráfico.
Têm razões e raízes bem mais profundas.
Elas estão tão escondidas que mudam até de nome,
se chamam de corrupção dos poderes públicos,
crimes de colarinho branco, verdadeiras obras de arte daqueles que
deviam promover a vida segura e possivelmente feliz da população.
São eleitos e pagos por isso. Para administrar o que é
de todos e para o bem de todos, não para proveito próprio
ou de quem financiou a campanha deles.
Existem injustiças, exclusões sociais, impunidades
e privilégios endêmicos que favorecem os crimes e não
se resolvem somente com medidas policiais ou com leis que já
nascem cheias de brechas para recursos infindáveis na justiça.
Também não seremos nós católicos com
uma Campanha da Fraternidade a resolver todos os problemas. Contudo,
e como sempre, esperamos que a coragem de falar, de denunciar e de
apontar saídas, consiga mexer com a consciência das pessoas
e das autoridades, para que ninguém se acovarde e se omita
das suas responsabilidades.
Se com este debate e com o amadurecimento da indignação
e da solidariedade da população conseguíssemos
que ao menos alguns dos promotores das injustiças e da violência
sentissem a vergonha de ser causa de tanto mal, já teríamos
alcançado um grande objetivo.
Digo isso porque estou convencido que todos devemos nos sentir responsáveis
e protagonistas na luta contra a violência nas suas sempre novas
manifestações. Corrigindo a nossa maneira de agir, se
for necessário. Por exemplo, os pais, quando agridem os filhos
ou exaltam o clima de competitividade entre as pessoas. Os educadores
em geral quando se limitam aos fatos e não educam os jovens
a analisar as causas novas e antigas da violência. Os formadores
de opinião quando, através de todos os meios de comunicação,
dão tanto espaço às notícias de brutalidade,
sem questionar a consciência do cidadão, que acaba achando
normais os assassinados, as brigas de gangues, os crimes com requintes
de crueldade. Por fim os poderes públicos, quando dão
mau exemplo na corrupção, no desvio do dinheiro do povo,
apoiando privilégios e favorecendo a impunidade.
Devemos agradecer a todos aqueles e aquelas que de tantas formas
com firmeza e criatividade, com o coração puro e o olhar
penetrante nos ajudam a continuar a sonhar num mundo de paz, de respeito
à vida, de justiça. È esta a fila que deve aumentar:
a dos homens e das mulheres de boa vontade, simples e honestos, capazes
de alegrar-se com o bem e de indignar-se com o mal.
Precisamos de conversão também dentro da Igreja, com
relações mais fraternas, exemplos concretos de generosidade
e de perdão, experiências de integração,
tolerância e colaboração entre diversos.
A paz é fruto da justiça, é o lema da Campanha
da Fraternidade deste ano. Plantamos sementes de justiça e
de amor, colheremos a paz e a segurança que tanto desejamos.