UM CHAMADO Á RAZÃO
João Silva
Além de um chamado á razão, infelizmente não
ouvido por mentes torpes e doentias (“Pára papai, pára
pai, pára...”), impressionam no caso “Isabela”
a frieza dos Nardones, a brutalidade dos assassinos, e a sobriedade
do promotor Cembranelle, passados quase trinta dias em que aquele
corpo de menina foi jogado do alto do edifício “London”,
na zona norte de São Paulo.
O Promotor Cembranelle, desde que foi exigida a presença do
Ministério Público para fazer acompanhamento do trabalho
de investigação e elucidação do crime,
tem tido uma postura correta, diria que acima, bem acima da média
brasileira; fala pouco, fala o necessário, não é
dado a exageros e sensacionalismo.
Claro que o crime causou um clima de comoção nacional!
Claro que todos que trabalham para elucidá-lo, para informar
a sociedade sobre trágico destino de Isabela não podem
agir sem comedimento diante dos fatos, não podem antecipar
julgamento ou estimular a ira da população contra famílias
que estão bem no meio desse caso sem precedente no Brasil,
ao que se sabe.
Portanto, trabalho do promotor Cembranelle, da Polícia Civil
e da imprensa, até agora, tem sido exemplar; vejo em curso,
de todas as partes citadas, grande esforço para conter exageros,
preservar as famílias envolvidas, o que não pode ser
confundido com o direito que todo cidadão tem de perceber,
com avanço das investigações, para que lado se
inclina a autoria do crime.
A Polícia de São Paulo é a melhor do Brasil,
mais bem aparelhada, segundo especialistas; tem à mão
todos os recursos científicos que facilitam o trabalho de investigação
nos paises mais desenvolvidos do mundo, tanto é que, sem confissão
e testemunha ocular, peritos foram capazes de levantar provas apagadas
da cena do crime, e refazer, passo a passo, as últimas horas
do drama e da vida de Isabela.
Neste caso, a Policia e o Ministério Público, como
instituições da democracia a serviço da sociedade,
enfrentam uma defesa bem articulada, feita por jovens e competentes
criminalistas bem pagos por uma família de classe média
unida, chefiada por experiente advogado e determinada a defender o
quê vai me parecendo cada vez mais indefensável. Isto,
sim, tem causado embaraços, mas nada que signifique algum dano
ao contraditório, à defesa a que têm direito suspeitos
de um crime em nosso País.
O fato novo é a declaração do Presidente Lula
sobre o caso. Foi mais uma declaração infeliz, dada,
a meu ver, em favor do casal para quem apontam provas recuperadas
cientificamente, além de depoimentos e outras evidências,
a ponto de já haver sido indiciado, estando por ser denunciado,
depois de passar por prisão temporária. Inoportuno,
também quis dar lição de moral na imprensa, atribuir-lhe
exageros, pirotecnia, essas coisas.
Verdade é que Lula, ao comentar o caso, expôs o desgaste
de uma relação pouco amistosa em se tratando da imprensa
investigativa brasileira, e aproveitou para fazer discurso para uma
família de classe média alta; demonstrou mais de uma
vez que não entende bem o dever que tem os meios de comunicação
de denunciar os erros do governo, dos petistas, não-petistas,
alados ou não envolvidos em escândalos, que procura abafar.
A criação da TV Pública é uma afirmação
dessa conduta, e significa uma reação pernóstica
contra a imprensa investigativa no Brasil.
O Presidente deveria dizer que acredita na Polícia, na Justiça,
no Ministério Público; deveria dizer que quer a solução
do caso, que acredita na aplicação da lei, na punição
dos culpados; o presidente deveria dizer que está penalizado,
que precisamos repensar a família, e o seu papel na sociedade
moderna, ao invés de alfinetar a imprensa ou afrontar a opinião
pública que acredita na apuração dos fatos.
Sobre último e desesperado chamado à razão,
infelizmente não atendido por mentes torpes e doentias, precisamos
saber de quem partiu; partiu de um dos filhos do casal, já
que Isabela estaria desacordada? Eu espero, e o Brasil também,
que mais adiante a investigação jogue luz sobre esse
ponto obscuro em que a lucidez de um menino levantou a voz contra
a brutalidade na cena do crime.